Três aniversários e um Vinho
Aproximava-se o aniversário de minha esposa. E eu sabia muito bem qual o presente ela esperava receber.
Ao final das aulas daquele dia comprei o vinho de sua escolha. Francês, dos bons. Um lindo pacote e um cartão bem romântico. Tudo certo.
Quando voltasse de viagem estaria me esperando ansiosa. Já tinha ligado e feito reserva num motel novinho em Maringá. Mas antes iríamos jantar num restaurante e assistir a um bom filme.
Quinze de novembro, feriado. E como estivesse viajando muito, precisava trabalhar até as dezoito horas do dia quatorze, pois a agenda estava fechada há vários dias. Só não esperava receber um paciente de emergência quando saía do consultório. A pequena Bruna chorava muito e precisava de atendimento naquele momento. Então...
Ao tocar o telefone a secretária correu para atender: “É ela. – pensei”.
E era.
Impaciente, cobrava insistentemente meu compromisso.
Um pouco atrasado acabei chegando e voando me arrumei. Acabamos chegando ao shopping uns vinte minutos depois do início do filme. A próxima sessão seria às vinte e duas horas. “Tarde demais” – dizia ela.
─ Então vamos jantar primeiro. – sugeri.
─ Com esse sol de verão no rosto? Vamos dar uma volta.
O tempo estava um pouco fechado. Nem mesmo parecia que iria chover. Mas em poucos instantes o céu escureceu e logo choveu forte. Relâmpagos cortavam o céu serpenteando fogo por todos os lados e os trovões ensurdeciam. E o restaurante acabou fechando muito antes do previsto diante daquele rápido dilúvio.
Já me preparei: vai explodir.
E não deu outra. Falava e gesticulava, me culpava, praguejava e reclamava. Tudo muito previsível.
Encontramos outro lugar e jantamos. Uma coisinha mais simples, como ela mesma havia sugerido. E
começou a queimação: parecia soltar fogo pelas ventas de tanta azia. Farmácia... Remédios... Raios e trovões. De todo tipo.
─ Vamos embora que hoje não adianta. Deu tudo errado.
E partimos. Banco deitado, olhos fechados e um baita bico.
Quando me aproximei do Motel perguntei:
─ A noite não está totalmente perdida. Tem certeza que quer mesmo ir embora?
Ajeitando-se no banco disse:
─ Sabe que estou me sentindo bem melhor!
Escolhi a suíte que imaginei poder aplacar sua ira. Entramos, abri a porta enquanto ela pegava sua bolsa. De repente, um estrondo e lá se foi a luz. E ninguém viu nada do ambiente.
Depois de uns vinte minutos de esperança resolvemos sair. E aquela fila de carros estava formada no portão eletrônico.
─ Minha mãe me mata. – dizia a mocinha que acompanhava um senhor à nossa frente.
─ E minha mulher, o que você acha que vai fazer? – respondia o de cabelos grisalhos.
Confusão total. Meia dúzia de homens forçando o pesado portão.
─ Você não vai ajudar? – minha esposa perguntava.
─ Claro que não. Está chovendo muito e aqui está bem melhor.
Nesse dia terminamos em casa no maior zero a zero. E o vinho teria que esperar até o próximo aniversário.
E ele chegou. Sem pacientes nem atraso. Salão, roupas novas, barba feita e carro lavado. Saímos no horário marcado, mas quando tínhamos andado uns poucos quilômetros começou o maior fumaceiro dentro do carro. E foi aquele desespero. Mas onde estava o fogo? Ninguém viu. Por via das dúvidas voltamos e ela, pegando fogo. Liguei para os meus irmãos e todos estavam namorando. Nenhum carro disponível e mais uma vez o vinho voltou para casa.
No terceiro aniversário lá estava o vinho. As taças preparadas. Lingeries... Batom... Flores.
E o lugar realmente era lindo. Perfeito. Quer dizer, quase perfeito. Quando ela colocou o vinho sobre a mesa empalideceu. A mesa se inclinou levemente e a garrafa escorregou, espatifando-se no chão. Se eu dissesse que uma camisa-de-força me teria sido útil naquele momento não seria exagero.
─ Calma, não se preocupe. Eu peço outro.
Enquanto ela ainda praguejava eu juntava os cacos e secava o piso.
Logo chegou o novo vinho que abrimos, brindamos e apenas sentimos o gosto. Uma sensação estranha me invadiu e a tontura me venceu. O cheiro do vinho que invadiu o local me entorpeceu. O Que fazer?
─ Vamos embora? Não estou me sentindo bem. – ela me disse, calmamente.
E voltamos para casa e batemos um bolão.
Edson Tavares
A Academia de Letras, Artes e Ciências Centro-Norte do Paraná, fundada em vinte e sete de julho de 2000, é uma sociedade civil sem fins lucrativos, que tem por finalidade o cultivo, a preservação e a divulgação do Vernáculo e da Literatura - nos seus aspectos científico, histórico, literário e artístico - bem como das Artes e das Ciências, podendo participar de iniciativas úteis ao desenvolvimento cultural da região, do Paraná e do Brasil.
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